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Playstation, sonho de consumo entre crianças e adolescentes

 

Célia Martins da Mota Fonseca

 

O objetivo deste trabalho é analisar as relações estabelecidas entre os usuários do videogame Playstation através das teorias contidas no livro “Consumidores e Cidadãos” escrito por Nestor García Canclini.

 

O Playstation é um videogame lançado pela indústria Sony no Japão em três de dezembro de 1994, com o objetivo de desenvolver o sistema de CD e se tornar competitivo, a fim de ocupar posição de destaque no mercado de videogames. O projeto foi um sucesso e superou a Nintendo que era líder nesse segmento. Devido à grande aceitação do público, o videogame passou por vários aperfeiçoamentos e foram criadas várias versões, sendo o Playstation III o último da série.

 

O consumo desse produto seduz principalmente crianças e adolescentes, que chegam a ficar 12 horas na frente da televisão entretidas com os jogos, preterindo programas como teatro, cinema etc. É diversão fácil que garante interatividade entre os participantes através da internet dentro de casa, longe dos perigos e desconfortos da cidade, onde existe o risco de assaltos e trânsito congestionado, entre outros. Canclini afirma que tais entraves, juntamente com a fidelidade em relação ao grupo (enfatizado no livro com relação aos contextos familiares, de bairro e de trabalho, como reguladores do desvio nos gostos e nos gastos, mas que trago ao texto para evidenciar também a fidelidade dos jogadores em relação ao Playstation), são os principais motivos que afastam as pessoas desses espaços públicos. Os consumidores de Palystation dão preferência a lugares como Lan Houses e Cyber Cafés, onde podem ter acesso fácil aos jogos, assim como interagir e jogar on line com outros freqüentadores.

 

CANCLINI

 

O autor menciona que o consumo promove exclusão. Nesse sentido vale lembrar que o Playstation é um aparelho caro, acessível somente a quem tem poder aquisitivo alto. Segundo dados retirados do site www.mercadolivre.com.br no dia sete de novembro de 2008, o preço está entre R$100,00 (a primeira versão, usada porque já saiu de linha) e R$1.739 (Playstation III), sendo que até mesmo os jogos são inacessíveis por menos de R$39,00.

 

Também no âmbito do consumo de jogos para Playstation II, existe falsificação de CDs, ou seja, a produção de CDs piratas, o que caracteriza comércio informal desses produtos, criando condições propícias às pessoas que não possuem capital para pagar R$150 por um lançamento, adquirindo esses games por R$10.

 

A maioria das crianças e adolescentes de todas as classes sociais sabe o valor sociocultural desse videogame, pois ele é o sonho de consumo entre eles. Quem possui um Playstation (de preferência o último lançamento) pertence a um seleto grupo composto por alguns privilegiados, por isso ele é usado como instrumento de diferenciação que segundo Canclini, não faria nenhum sentido caso o seu valor só fosse compreendido pela elite que o utiliza.

 

Existe uma grande diversidade de jogos compatíveis com o aparelho, que estão à disposição do usuário e isso confere ao produto uma ampla abrangência de público. O Playstation, apesar de ser uma produção japonesa, já se disseminou por vários países, ou seja, é desterritorializado (outro termo citado no livro “Consumidores e Cidadãos”), deixou o seu padrão japonês para se tornar mundial, atingindo consumidores das mais diversas raças, cores, idiomas e idades, adequando-se ao perfil de cada país no que diz respeito à linguagem e gosto específico, por exemplo, o jogo mais vendido nos EUA não é o mesmo na Europa, ou no Japão etc.

 

“O consumo é visto não como uma mera possessão individual de objetos isolados, mas como apropriação coletiva, em relações de solidariedade e distinção com outros, de bens que proporcionam satisfações biológicas e simbólicas, que servem para enviar e receber mensagens”.

(Consumidores e cidadãos, pág.70).

Essa citação de Canclini serve para refletirmos sobre os motivos que levam os consumidores desses games a afirmarem sua posição social privilegiada através desse bem simbólico. As pessoas que compõem esses grupos (segundo a visão socioantropológica) não o fazem apenas por satisfação de necessidades, ou entretenimento, elas se apropriam do Playstation como objeto de distinção segundo “a lógica de escassez desse produto e a impossibilidade que outros o adquiram”. Ao contrário do que muitas pessoas imaginam, o consumo é muito mais do que um ato banal de compulsão ou alienação, trata-se de uma ação calculada, tendo em vista propósitos específicos de acordo com a necessidade de cada um.

 

INTERATIVIDADE

 

Os blogs, comunidades no orkut (site de relacionamento) e eventos direcionados aos consumidores desse aparelho proporcionam a inserção dos indivíduos em um grupo de prestígio, que é dividido em vários subgrupos.

 

Nas comunidades do Playstation existentes no orkut as pessoas divulgam novos jogos, fazem enquetes a fim de apurar os mais consumidos, trocam informações, compram e vendem seus aparelhos usados, dão dicas e esclarecem dúvidas. Algumas vezes os membros dessas comunidades se adicionam no MSN, podendo dessa forma trocar mensagens em tempo real.

 

Quem tem um Playstation III, além de assistir a DVDs em alta definição pelo sistema blu-ray, pode jogar on-line com outros usuários, dessa forma, assim como no MSN, podem estabelecer laços de amizade, caracterizando um novo modo de interagir. Os jogadores se inserem em pequenos grupos que são diferenciados dos outros pela preferência por alguns jogos específicos, como o Fifa, por exemplo. Tais grupos também surgem nas escolas e são formados pelos adolescentes que possuem o aparelho.

 

Segundo Canclini, nesse sentido, o consumo aproxima essas pessoas, formando uma rede de integração onde os componentes se unem pela afinidade em relação a determinados produtos, nesse caso, o Playstation.

 

VIOLÊNCIA NOS GAMES

Alguns jogos como Counter strike (CS), Doom e GTA foram embargados pela justiça no Brasil. O juiz Carlos Alberto de Tomaz, (17º vara da sessão judiciária de Minas Gerais) responsável pela proibição e recolhimento desses jogos em locais públicos,declara em matéria publicada no site www.folhaonline.com.br que os jogos incitam a insubordinação da ordem social. O certo é que esses games, entre outros, se mostraram perigosos quando utilizados por crianças e adolescentes, na opinião de vários estudiosos.

 

O GTA (Grand Theft auto, ou grande roubo de carros), por exemplo, simula a violência das ruas em situações onde o jogador ganha pontos roubando carros, pichando muros e matando componentes das gangs rivais, além de fugir da polícia. Um jogo como esse exerce uma influência negativa nos adolescentes, pois estimula o comportamento agressivo desses jogadores que por serem jovens sofrem crises de identidade e instabilidade emocional, comum à idade, pois ainda estão em processo de formação. Eles passam cada vez mais tempo em função dos aparelhos, que algumas vezes se transformam em verdadeira obsessão.

 

Uma pesquisa realizada por um grupo de estudos na “Universidade da Carolina do Norte” apontou que a exposição desses jovens aos jogos violentos causa danos as suas funções cerebrais e comportamento tornando-os insensíveis às manifestações de violência fora dos videogames (informação obtida no site www. acores.com/a/video_jogos.html).

 

Em alguns casos esses usuários transcendem o mundo virtual dos jogos chegando até mesmo a se identificarem com certos grupos (gangs, no caso do GTA) na maneira de se vestir, linguagem e postura social.

 

 BABÁS ELETRÔNICAS

 Qual seria o real motivo dessa mudança de comportamento do jovem contemporâneo? Para tentar responder a essa pergunta, devo me reportar ao livro “Teorias da Globalização” que levanta a importância do tempo e do espaço nesse processo acelerado de capitalização, ou seja, a sociedade incorpora o sentido da frase time is money, agregando cada vez mais tarefas ao cotidiano, nesse sentido os avanços tecnológicos possibilitam a invasão dos espaços familiares por assuntos de trabalho, através de celulares, internet etc. Resumindo, o espaço familiar, que antes era usado para a interatividade entre as pessoas da família, se reduziu consideravelmente.

Aparelhos tecnológicos como televisão, computador e videogame não se restringem somente a espaços de entretenimento, mas também desempenham o papel de babás eletrônicas, informando, distraindo e até educando crianças e adolescentes, cujos pais, muito ocupados com o trabalho, delegam essas funções a pessoas que às vezes não são as mais apropriadas.

 

Do outro lado dessa discussão, estão os que afirmam não ser de responsabilidade dos jogos as tendências à violência e o descontrole emocional demonstrados pelos jovens, e sim de todo um contexto familiar e social.

 

 QUEM DEFENDE OS JOGOS VIOLENTOS?

Segundo dados retirados do site www.continue.com.br , o produtor da série de jogos “Metal Gear” (espionagem com ação), Hideo Kojima, afirma que sua intenção é fazer o jogador refletir sobre o real significado da violência. Kojima diz que tem trabalhado na fidelidade das expressões de dor, desfigurando os rostos, para que o indivíduo entenda o que está fazendo e aprenda a se responsabilizar pelas suas ações. Algumas pessoas que tiveram a oportunidade de jogar Metal Gear III, defendem a capacidade de Hideo Kojima em despertar o sentimento de culpa nos jogadores.

 

O jornalista e especialista em cultura pop, Gerard Jones defende em seu livro, “Brincando de Matar Monstros”, uma necessidade entre as crianças e adolescentes, da violência no âmbito da fantasia, de forma lúdica, para liberar tensões e combater medos. Gerard defende a presença de games violentos nessa faixa etária. Através de discussões com adultos envolvidos nesse tema e usuários desses tipos de jogos, Jones concluiu que a ausência deles pode contribuir para o aparecimento da violência na vida real (informações obtidas no site www.entrelinhas.unisinos.br). Trata-se de uma discussão polêmica, onde especialistas e leigos manifestam pontos de vista diferentes.

 

Os jogos tornam-se cada vez mais sofisticados, pois se renovam todos os anos conquistando cada vez mais consumidores além de manter fiéis os que já possuem. O Fifa, por exemplo, (simula jogo de futebol) lança novidades periodicamente, com definições de imagens cada vez mais fiéis à realidade, tal fidelidade não se restringe apenas à forma física dos jogadores, mas também na reprodução de características específicas de cada um no estilo de jogar, nos trejeitos etc.

 

O Flight Simulator (simulador de vôo) teve seu último lançamento em 2002, pois na ocasião do ataque de terrorismo às Torres Gêmeas, (11 de setembro, nos EUA), os jornais divulgaram que os suicidas fizeram todo o treinamento através desse jogo, que possui todos os componentes de um avião de verdade, simulando até mesmo as horas de vôo. Nesse sentido tornam-se evidentes as facilidades que os avanços tecnológicos proporcionam ao possibilitarem o acesso de informações que só deveriam ser disponibilizadas aos profissionais de determinadas áreas (aviação, nesse caso).

 

Mesmo entre os jogadores de Playstation não se pode definir uma homogeneidade, pois existem vários jogos de estilos diferentes, o que dá ao consumidor um leque de opções e acaba diferenciando-o dos outros pelas escolhas. Tal teoria também é defendida por Canclini, pois ele afirma que “o consumo não causa a homogeneização da sociedade”.

 

Uma característica marcante no caso do Playstation é a rapidez que os aparelhos e jogos tornam-se obsoletos, o que talvez se justifique pela constante busca dos consumidores de componentes eletrônicos por novidades.

 

ANÁLISE

Estudando o consumo do Playstation, conclui-se que existe no âmbito das relações entre as pessoas que se identificam com esse aparelho, uma rede de integração à parte.

Através das teorias de Canclini podemos avaliar todos os significados que envolvem as atitudes, intenções e necessidades que levam os indivíduos a se afirmarem como cidadãos através de sua condição de consumidor.

Quando um sujeito adquire um Playstation, não está comprando somente um aparelho de entretenimento, mas também prestígio, interatividade, diferenciação social, inserção em grupos diferenciados e status, além de muita diversão, é claro.

Nesse sentido torna-se inevitável resgatar uma das idéias centrais de Canclini nesse livro: “O consumo serve para pensar”  

 

 

 

REFERÊNCIAS: 

 

 

 CANCLINI G. Nestor.“Consumidores e Cidadãos”

IANNI Octávio.“Teorias da Globalização”

BARBERO M. Jesús.”Culturas Juvenis no Século XXI-As Mudanças na Percepção da Juventude: sociabilidades, tecnicidades e subjetividades entre os jovens”.

CASTRO D.V. Carlos – “Nova Geração de Videogames: verdadeiras centrais de entretenimento digital” (Monografia).

 


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